sábado, 15 de junho de 2013

De marré, de si

Eu me fascino com coisas caras. 
Não coisas caras por serem caras, ou caras para excluir o acesso de outras pessoas, nem caras para exibir o uso de coisas caras. Estou falando de coisas caras porque possuem uma qualidade superior às demais do gênero. 
Como nunca fui rico, apesar de alimentar intimamente um sentimento de que isso foi um erro do Universo, nunca tivemos coisas caras em casa.
Na época do Plano Cruzado, quando o governo ordenou que a população evitasse comprar os supérfluos para que os preços caíssem, a ordem foi facilmente seguida lá em casa. Minha mãe já os evitava e tinha sua própria noção do que era supérfluo. Sua lista incluía refrigerantes e iogurtes e qualquer marca de produto que tivesse uma similar mais barata. 
Por outro lado, quando tive hepatite, vi a geladeira se encher de produtos em quantidades nunca antes vistas naquela casa e alguns que eu nem sabia que existiam, como figo em calda. Quase desejei que a hepatite durasse mais um pouco. 
Não que faltasse algo em casa, apesar das dificuldades. Sempre tínhamos bolos, doce de leite, pudim, arroz doce e várias delícias que minha mãe fazia. Isso na comida. Em termos de brinquedos, minha mãe investia em jogos na esperança de que eu brincasse com meu irmão 4 anos mais novo. 
E até funcionava com alguns como o jogo do Tom & Jerry, pega-varetas, Lig-4, entre outros. Nunca me decepcionei com nenhum brinquedo que ganhei, mesmo não sendo caro ou tecnológico (tão tecnológico quanto se podia ser na época), mas gostei quando ganhei alguns que, certamente, foram mais caros. Como a Fuga Maluca, o Playmobil, o Hit Train. Gostava deles, não porque eu soubesse que eram caros ou porque eu via na TV, mas porque sentia a qualidade do produto. Lembro que na época dois sonhos de consumo infantil eram Ferrorama e Autorama. Apesar de caros, esses brinquedos me decepcionaram quando tive contato com eles. O Autorama consistia em rodar um carro por uma pista, minha Fuga Maluca consistia em abrir e fechar rotas, para que o carro de polícia conseguisse alcançar o do bandido. Os carros da Fuga eram pesados, com a carcaça de metal e a carroceira em plástico duro. O Autorama era levinho. Da mesma forma, o Ferrorama, apesar de parecer mais com um trem do que o meu, era preto, leve, pequeno e tinha poucas opções de movimento. Meu Hit Train (Acho que era da Troll) era colorido, pesado, grande (nossos periquitos passeavam nele. Um na locomotiva, outro no vagão de carga) e tinha diversas opções de mudar os caminhos, parar, trocar a direção, desengatar os vagões... Ou seja, não era porque meus brinquedos eram caros que eu gostava deles, era porque eles me divertiam a ponto de fazer valer o preço. Os outros, mais caros até, não me atraíram. 
Depois de adulto, continuei gostando e admirando coisas caras que valem o quanto custam. 
Jamais pagaria uma fortuna pra ir num restaurante badalado, porque "a nata da sociedade" o freqüenta. Mas faço a extravagância de pagar bem, vez ou outra, para jantar em um lugar mais caro e comer pratos que não se encontram nas praças de alimentação do shopping. 
Esse texto todo veio ao andar com minha mala de couro pelo salão do aeroporto. 
Nunca tive uma mala de couro antes. Nunca comprei uma mala de couro. Essa foi presente. Mas desde ontem, enquanto arrumava a dita, reparava na qualidade da bicha. 
E, nesse ponto, acho que quem compra genéricos, em sua maioria, é mais exibicionista do que quem compra um produto original. O produto genérico não tem a mesma qualidade do original, apenas a aparência. Então, quem compra genérico está pagando só por isso. 
Tão ridículo quanto pagar caro por um produto que não vale aquele preço absurdo é pagar mais barato por um apenas porque parece caro. 

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