domingo, 24 de fevereiro de 2013

Quero morrer numa batucada de bamba

Que me desculpem os jornalistas, médicos, advogados, promotores, juízes e o público em geral, mas se forem verdadeiros os depoimentos das testemunhas de acusação, a Dra. Virgínia Helena não cometeu eutanásia. Pelo menos, não nesses pacientes relacionados nas matérias e dos quais a estão acusando de ter matado.

Em primeiro lugar, o código penal brasileiro em vigor, salvo engano e que me socorram os advogados, não trata de eutanásia. Trata de homicídio, de auxiliar suicídio, etc.
Então, do ponto de vista criminal, ela só poderia ter cometido ou crime de homicídio ou o crime de "induzimento, instigação ou auxílio a suicídio", a depender do ato que praticou.

Mas fora do âmbito penal, também não se pode falar em eutanásia para o caso, repito, a se julgarem verdadeiros os relatos da acusação.

Primeiro, vou tentar resumir um pouco o que entendo sobre o assunto e dessa vez que me socorram os médicos se eu estiver errado. Eutanásia consiste em abreviar a vida de um paciente incurável, a fim de evitar-lhe mais sofrimento. Ela pode ser ativa, quando o médico faz algo que abreie sua vida ou passiva, quando, ele deixa de fazer algo e isso que ele deixa de fazer abrevia a vida daquele paciente.
Há um conceito parecido e muito próximo da eutanásia passiva que é a ortotanásia. A ortortanásia é não usar recursos artificais desnecessários que prolongariam de forma artifical um paciente que já estaria morto naturalmente. É um limiar tênue, mas há uma diferença que os médicos entendem na teoria, apesar de que, acredito, às vezes na prática eles precisem de muitos cuidados pra diferenciar um e outro. Na eutanásia passiva, o médico deixou de fazer algo e, com isso, o paciente morreu antes da hora devida. Ou seja, ele deixou de praticar um ato que deveria ser praticado para prolongar que o paciente vivesse por sí só. Deixou de dar um remédio, de usar determinado aparelho.
Na ortotanásia, ele deixa de tomar uma atitude para prolongar um viver artificalmente. Ele não fez o paciente morrer antes da hora, ele evitou que o paciente morresse depois da hora.
A ortotanásia é permitida no Brasil. A eutanásia, mesmo passiva, não.

Mas o primeiro ponto é esse, pra saber se o que a Dra. cometeu foi eutanásia ou ortotanásia é preciso saber quais as condições dos pacientes e qual a relevância do aparelho que ela desligou para a vida daquele paciente. Isso não vai ser jornalista, juiz, jurado, promotor, advogado ou opinião pública quem pode dizer. Apenas os médicos.

Porém, do ponto de vista legal, mesmo que fosse ortotanásia, ela só pode ser praticada com consetimento do paciente ou representante legal, segundo Resolução CFM 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina. E o médico tem que registrar e fundamentar essa decisão. Ou seja, ele assume que etsá fazendo a ortotanásia por esse e esse motivo, e presta todo o auxílio ao paciente até que ele morra naturalmente.

Mas mesmo que a Dra. tenha abreviado a vida natural dos pacientes, os relatos dizem que seu objetivo seria "esvaziar a UTI". É consenso que ela só praticava isso contra pacientes do SUS. Então o seu intuito não era abreviar o sofrimento do paciente, mas liberar leitos de pacientes, cujo pagamento é feito pelo governo, para que fossem ocupados por pacientes particulares ou de convênio, cujo valor do pagamento é maior.
Isso não é eutanásia nem aqui nem no Oregon, estado americano onde ela é permitida. Isso é homicídio.

Acho que a confusão com os termos só ajuda a estigmatizar a eutanásia, fazendo com que as pessoas fujam de um debate a respeito de uma possível legalização.
No imaginário popular, legalizar a eutanásia vai ser permitir que médicas como essa saiam matando as pessoas, da mesma forma que os ignorantes acreditamq ue se não colocarem no RG que não são doadores de órgãos, serão vítimias de quadrilhas formadas por médicos para os matarem e retirarem seus órgãos. Como se quadrilhas que matam pessoas estivessem preocupadas em ler o RG pra ver se pode ou não tirar o órgão ilegalmente.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Verdades e mentiras

No país das impunidades, os justiceiros costumam apontar seus dedos indicadores e gritar "bruxa", como se isso resolvesse todos os problemas. 
Não resolve e ainda ajuda a não combater as verdadeiras causas dos problemas.

A prisão dos integrantes da banda envolvida no aciednete da Boate Kiss é absurda. Não se admite prisão preventiva em crime culposo, que é o que realmente aconteceu (a menos que o paradeiro do acusado seja desconhecido). Para "driblar" isso, a acusação foi de dolo eventual. 
Ora, para se pensar em dolo eventual, teríamos que assumir que os músicos sabiam (ou deveriam saber) que o teto era coberto de material altamente inflamável, que a distância era pouca e mesmo assim acenderam o artefato. Temos que considerar que o risco era presumível. É razoável imaginar, e o fato de várias pessoas teremn morridio e a comoção popular não pode mudar isso, que os músicos não imaginaram ser possível que o teto pegasse fogo. Talvez nunca tivessem reparado qual o tipo de material que era usado sobre o palco e só sobre o palco, diga-se de passagem, justamente onde eles estavam. Fica, então, a hipótese de quer eles agiram com imprudência, ao acender o troço em um local fechado. Portanto, crime culposo.
É diferente do motorista que dirige embriagado, quando os riscos de acidente são amplamente divulgados e fazem parte do senso comum. É diferente se provarem que alguém alertou eles de que o teto era de espuma e que podia pegar fogo.

A acusação de crime com dolo eventual para os donos do estabelecimento é admissível se estiverem considerando que eles deliberadamente deixaram de fazer algo que a lei obrigava e que eram claros (pelo senso comum) os riscos em decorrência dessa negligência.

Bom, mas e quanto à prisão?
A lei brasileira diz que:
Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Flagrante não foi. E também não foram condenados a nada ainda, sequer julgados. Vejamos acerca da prisão preventiva, o que diz a lei:

Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único.  A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o). (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
Art. 313.  Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Parágrafo único.  Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). 

 
Quanto ao fato de o crime ser doloso, já deixei minha opinião sobre os integrantes da banda. Mas ainda que fosse, qual a garantia de ordem pública que justifica a prisão? De ordem econômica? Qual a conveniência da instrução penal? Eles podiam fugir do país? Tomem seus passaportes! Eles estavam atrapalhando as investigações? Em nenhum momento foi dito isso. Eles ameaçavam testemunhas? Também não disseram isso, e acho difícil que eles conseguissem ou tivessem meios para ameaçar tantas testemunhas. 
Enquanto houver leis nesse país, temos que seguí-las. Há sempre a alternativa de rezar pela volta da ditadura, onde prisões eram feitas pela conveniência da autoridade, como parece ter sido o caso. Outra opção é pedir leis mais duras, onde qualquer indiciado por crime seja preso até que se prove sua inocência. Países de regime totalitários costumam adotá-las. Resolva-se, Brasil!

Hoje a TV mostrou a entrevista, inteligentemente concedida em uma cama de hospital, com um dos donos da boate.
Ele tenta se defender para não ser acusado além da conta, e fala verdades inconvenientes para o poder público, como a revelação de que os bombeiros indicaram pra ele a troca das portas da boate com uma determinada empresa pertencente a um bombeiro. Ou seja, a corrupção que normalmente impera, o "por fora" do serviço público, a caixinha para agilizar, a troca de favores para conseguir um alvará, mata e pode matar muita gente. E a culpa não é só de quem recebe. É também de quem paga, sob a alegação de que sem isso não se consegue nada, é de quem não denuncia. Então, antes de apontar o dedo tão fortemente procurando pelos responsáveis pelo homicídio na boate, faça um exame de consciência.
Por outro lado, o dono da boate disse não ser responsável pela superlotação. Ele disse:
 "Eu não sou um perito, eu não sou... Eu não fiz legislação, eu não sou estudado nisso" E seu advogado disse: "O meu cliente não sabe o número exato de pessoas que havia na casa aquela noite, porque ele não fez essa verificação, a noite foi interrompida"
Desculpe, mas o único estudo que se precisa é da matemática. E quanto à verificação, não se tratava de uma festa boca livre numa faculdade, organizada por bêbados e maconheiros. É ridículo imaginar que uma casa, funcionando com comandas, não possa fazer o controle exato de quantos pessoas entram e saem. Só falta dizer que eles não controlam o consumo e que acreditam na palavra dos funcionários quanto ao valor arrecadado.
Também foi bobagem tentar dizer que não sabia que a banda ia fazer o show pirotécnico. Foi provado que a banda sempre fazia isso, inclusive na própria boate. Feio, muito feio, tentar culpar apenas a banda.
Por outro lado, um integrante da banda tenta dizer que o artefato nada teve a ver com o incêndio. Desesperador, muito desesperador, tentar encobrir isso.
  
 
Envolvido nisso até o pescoço, o poder público em todo o país segue fechando estabelecimentos e fazendo o que deveria ter sido feito sempre. Medidas populistas parecidas com aqueles que sucederam ao acidente do Bateau Mouche e que logo caíram no esquecimento, o que ocasionou outros acidentes semelhantes. Pequenos e médios empresários, com casas em situação irregular, estão sendo devidamente notificados. Grandes empresários, certamente não serão incomodados. Mas não há garantias de que o "jeitinho", a propina, o favor, não reabra as casas, camarotes e similares.
 
 

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Quem é contra o povo curte

A recente campanha contra Renan Calheiros para presidente do Senado é muito estranha.

Primeiro que a campanha circula no Facebook, entre pessoas que não possuem voto algum no Senado.

Segundo que os motivos alegados para que Renan Calheiros não seja presidente são motivos para que ele não seja sequer senador ou que exerça qualquer cargo público.

Ou seja, se Renan está apto, do ponto de vista legal, para ser senador, também o está do para ser presidente do Senado.

Do ponto de vista moral, ao invés de pedir que outros senadores votem em Renan para presidente do Senado , as pessoas não deveriam ter votado nele para senador.

Se partimos do princípio que o sistema eleitoral brasileiro é correto e que os eleitos representam a vontade da maioria da população, Renan Calheiros é um legitimo representante do povo e qualquer ataque a ele, é um ataque ao povo que o elegeu. Boicotá-lo seria retirar os direitos da população de determinado estado que votou nele dentro das regras estabelecidas pela democracia.

Para quem, como eu, acredita que as eleições são uma farsa, com regras que favorecem a candidatura dos mesmos e sua perpetuação nos cargos, não há outra saída senão votar nulo, baixando os números expressivos de votos dos eleitos e tirando deles esse discurso de que são legítimos representantes da população.

Que PI é essa?

Salvador sempre teve um público cativo de teatro que lota salas. Pelo menos, se estivermos falando de peças com atores globais. Não importa...