domingo, 7 de novembro de 2010

Shirley

Desde a primeira vez que ouvi falar em Trilogia Shirley eu estranhei. Afinal, eu havia visto apenas duas peças.
Na época, eu não tinha tanto contato com Claudinho, e aceitei a desculpa de que o pessoal tinha optado por montar apenas duas das peças.
Passou-se o tempo e vejo anunciada outra montagem das Shirleys. Opa. Novamente, apenas duas peças encenadas.
Que diabo de trilogia é essa? Procuro na internet. Encontro referências à trilogia, mas quando procuro as montagens, sempre duas. Que mistério!
Vi um site que tinha os textos de Claudinho, pensei que ali teria a resposta. Nada. Havia vários textos de Claudinho. Na parte das Shirleys, tinha o nome das três peças, mas só duas estavam disponíveis para download.
Comecei a pensar em conspiração, maldição, brincadeira ou golpe de marketing.
Falei com Claudio Simões, na tentativa de dirimir essa dúvida que já me consumia há anos. Afinal, havia ou não três peças na famosa trilogia? E por que essa terceira nunca foi encenada? Onde estaria a Shirley esquecida?
Claudinho deu-me evasivas. Disse que eram três peças, como devem ser todas as trilogias, mas que os grupos montavam apenas duas, por motivos diversos. Alegou que não era marketing e garantiu que todas as três haviam sido montadas, porém alternadamente. Jurou que houve uma montagem das três, há sei lá quanto tempo, se não me engano em outro estado.
Não me convenci.
Eis que agora Claudinho anuncia a montagem da trilogia. Pensei: "qual será a desculpa que ele vai arranjar pra apresentar uma trilogia de duas peças?"
Paranóico, cheguei a pensar que Claudinho prepararia algo para o dia que eu fosse assistir, apenas para me provar que existiam três peças.
Informei que iria na sessão das 21:00h, mas fui na de 19:00
Ahhhhh! Ele ia ser pego de surpresa.
A primeira peça foi encenada. Lembrava dessa. Simplesmente Shirley. Mudança de cenário e veio a segunda. Totalmente Shirley. Essa eu também já conhecia. Tudo muito bom. Os atores muito bem, mas agora era a hora da verdade. Imaginava nos bastidores um Claudinho dizendo pro elenco que não havia terminado, pois um sacana que duvidava da existência da terceira peça estava ali e, portanto, eles teriam que voltar e fazer qualquer coisa.
Entra o elenco e... Finalmente Shirley.
Brincadeiras à parte, não duvido do talento de Claudinho de um dia bolar uma saída se uma situação dessas realmente ocorresse. Mas é óbvio que a peça existia e nos permite compreender melhor essa obra.
"Finalmente" não tem a mesma comicidade das outras duas (ou até tem, a depender do que você entenda como comédia), mas ao contrário de destoar, ela se integra e ressalta elementos das outras peças. Os dramas familiares que anteriormente me fizeram rir, por sequer percebê-los como tais, agora ganharam novos contornos.
Zeca de Abreu, Fernando Marinho e Fernanda Paquelet, só pra citar os três cujo trabalho eu já aplaudiria de pé, passaram de bons atores para "atores do caralho" na minha opinião. O fato de o próprio autor dirigir a encenação deve ter contribuído para que o tom certo fosse mantido, mesmo quando seria tentador dar aquela fala de um jeito mais engraçado para quebrar o climão. Não era preciso. A nossa tragédia diária é engraçada, mesmo, sem caras e bocas, sem maneirismos, sem salamaleques. Basta que sejam outros, e não nós mesmo, a observá-los.
Mil coisas passaram pela minha cabeça enquanto via "Finalmente Shirley": Será que ele escreveu antes das outras duas? Tem um quê autobiográfico? Tem um quê da MINHA biografia?
Lembro que Claudinho chegou a me mandar o texto das três peças há alguns anos, mas eu não lembrava de nada dessa terceira (mais um mistério que envolve essa trilogia). Na minha memória só existiam as outras duas.
Fiquei contente ao perceber, desde o começo, o tratamento que Claudinho ia dar para a tragédia que recaiu sobre a família. Para desespero de Alberto, que aguardava ansioso pela revelação do mistério, eu achava que já conhecia as obras de Claudinho o suficiente pra saber que ele era capaz daquilo. É a mesma satisfação que sinto quando percebo uma pista falsa nos livros de Agatha Christie. Eu penso: "você me tapeia muito, eu não descubro o assassino, mas pelo menos, nessa eu não caio".
É como uma pequena vitória diante de um mestre. A gente perde, pois acaba enganada, mas não é tanto assim.
Bom. Não sei se todos sairão do Teatro Modulo com a mesma sensação que eu, afinal foram anos de expectativa por essa trilogia completa, mas acreditem quando eu digo que valeu a espera.


Pelo celular: Djaman Barbosa.

Um comentário:

  1. E eu cortando o pulso de curiosidade em ir veer.. Mas acho que o mesmo em janeiro... O ENEM tá enlouquecendo a gente.
    PS - E se tu disse que existe a terceira peça, eu acredito. Pena que o charme da ¨trilogia de duas¨ que ¨só se vê na Bahia¨ acabou... :(

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Salvador sempre teve um público cativo de teatro que lota salas. Pelo menos, se estivermos falando de peças com atores globais. Não importa...