sexta-feira, 16 de abril de 2010

Em passos de formiga

- O sr. arranja uma mesa logo pra gente? Tem uma grávida conosco e não pode esperar.
Era a quarta vez que aquela senhora se dirigia a um funcionário do restaurante em menos de 5 minutos, com aquele discurso. Como a conversa era travada perto da minha mesa, eu não podia deixar de ouvir. Só que dessa vez ela continuou:
- Será que não já vai vagar uma mesa. Uma dessas que só tem uma pessoa. Porque tem uma mulher grávida esperando!
Liguei minha paranóia e achei que ela falou aquilo pra mim. Afinal, eu era uma das pessoas sozinhas que, ao que tudo indicava, ocupava indevidamente uma mesa inteira que poderia ser ocupada por quatro pessoas, sendo que uma delas tinha o grande mérito de contribuir para o aumento populacional, como se a humanidade precissasse de mais gente para consumir os nossos já escassos recursos naturais.
Então estar só me caracterizava como um cidadão de classe inferior em relação a um grupo de quatro pessoas? Ou era porque uma era gestante? Quem vai a um shopping center em véspera de Natal bem sabe que a gente não precisa de mais gente no mundo. Então, em termos de mérito apenas, aquela mulher não iria me comover a ceder minha mesa.
Em vez de comer mais rápido a minha feijoada, como parecia ser a sugestão, levantei a cabeça para analisar a situação.
A senhora em pé, ao lado de um senhor, e duas moças sentadas no balcão. Entre essas identifiquei logo a abnegada que daria sua contribuição para o futuro, despejando mais fraldas descartaveis sujas no ecossistema.
Se a buchuda (minha ira se dirigiu mais a ela do que à velha por alguns segundos) estava sentada, qual a urgência? Por que eles iriam passar na frente dos outros na fila se, inclusive, o balcão é lugar onde outros almoçavam? Pra completar, havia lugar suficiente pros quatro ali. Não havia nenhum desconforto pra grávida naquele lugar. E vou além: o John John é UM dos restaurantes do Comércio. Ele estava cheio naquele momento, mas os outros em volta não estavam. Em último caso, se a gestante (eu disse que foram só alguns segundos. A ira já tinha voltado para a velha) ia passar mal por esperar a mesa ali, ela poderia ir pra um dos outros restaurantes.
Claro, que temos que levar em consideração a situação de cada pessoa e não submetê-las desnecessariamente ao desconforto. Gestantes, idosos e deficientes não podem ser tratados da mesma forma que aqueles que tem melhores condições físicas. Mas isso tem que ser entendido primeiro por eles. Não faz sentido uma gestante se espremer nas ruas de Salvador durante o carnaval e querer que se lhe abram os caminhos.
A sua condição exige cuidados mas não é um privilégio.
Eu sempre repito que não entendo porque os idosos embarcam antes nos aviões:
- o lugar é marcado, não precisa chegar primeiro pra sentar e ninguém viaja em pé em avião.
- no salão de espera o idoso está sentado. Então tanto faz entrar antes e sentar no avião ou esperar sentado no embarque.
- o avião não vai sair antes de ele embarcar.
- o idoso se locomove com mais dificuldade, indo na frente fará com que a fila atras dele fique mal disfarçando a impaciência. Indo depois, quando já tiver passado boa parte daquela acomodação do sentar, o idoso fica até mais tranquilo.
Muito mais lógico que o idoso entrar na frente, era se tivesse um serviço de embarcar a bagagem de mão do idoso. Mas é mais um caso de não entender o objetivo da regra, tão comum nesse país.
Como a grávida que não queria almoçar no balcão, onde estava sentada sem risco algum pro seu feto, e queria passar na frente dos outros.
Ou como idosos que vão pras filas do teatro e querem comprar 4/6/8 ingressos. Ora, não sabendo se os outros são idosos, porque ele teria esse direito? Não na minha frente.
Por outro lado, vi uma vez um casal indo votar com um bebê. O mesário disse que a mãe poderia passar na frente, mas o pai teria que pegar a fila. Protestei que aquilo era ridículo, pois a mãe teria que ficar ali esperando o marido da mesma forma e o bebê ficaria exposto àquele ambiente cheio de gente que era o que a norma pretendia evitar.
O problema, mais uma vez, era entender o objetivo como um privilegio. Como se a maternidade desse àquela mulher status diferenciado em relação às outras. Respeito quem pense assim, mas num estado de direito todas as cidadãs são iguais quer tenham parido ou não e o que se pretende é não expor as gravidas ou crianças de colo a riscos. Isso o estúpido mesário não conseguia ver, até que eu e os outros da fila cedemos nossa vez ao pai da criança.
Voltando à gestante do restaurante, o garçon disse que as mesas estavam cheias, que naquele momento só tinha lugar no balcão. O acompanhante da senhora, sensatamente, sugeriu irem pra outro restaurante.




2 comentários:

  1. Como mulher grávida e futura contribuinte para a poluição do meio ambiente com as fraldas sujas de meu rebento posso garantir que: Havendo ventilação, podendo comer e beber água e principalmente: não havendo hemorróidas, não há maiores problemas em sentar naqueles banquinhos altos e desconfortáveis de balcão.
    Você pensou que talvez a grávida, coitada, além do ciático lascado, as hemorróidas atacadas, aquele calorão subindo, sentiu o cheiro da feijoada e desejou com todas as suas forças comer um pouco nem que isso tenha aumentado sua azia.
    Eu tenho certeza que se vc estivesse em uma situação delicada como recém operado, sentindo dores em orifícios que vc nem lembrava que tinha ou então daqui uns anos que sua coluna não suporte mais sem sobrepeso e a osteoporose faça vc se sentir diminuir, vc iria ter mais pressa para saciar sua fome em um lugar mais confortável e se mandar logo para casa.

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  2. Apesar do risco de debater com uma mulher com os hormônios alterados, vou te responder. Rsrsrssrsrsrs.
    Você tocou em alguns pontos interessantes. Pra começo de conversa, o balcão do John John não é com bancos altos e desconfortáveis, você pode ver nas fotos aqui (http://www.johnjohncafe.com.br/johnjohn.asp) que as cadeiras do balcão são da mesma alturas das mesas do corredor que são maioria. Aliás são as mesmas cadeiras. As do meio é que são mais baixas, mas nessas só cabem duas pessoas. Assim, pra sentar os quatro juntos ninguém tava ligando pras hemorróidas, ciático e calores da gestante, só pra passar na frente dos outros é que se preocupam com isso, tá?
    Depois, como você bem disse, recém operados, obesos e outros também tem dificuldade de locomoção, mas não tem lei especial pra esses casos. Como também não tem lei pra quem tem mãe inválida em casa e que precise almoçar rapidamente para voltar pra cuidar dela. Ou seja, todo mundo tem seus problemas e é loucura prever que a sociedade vá dar conta de atender a todos. Mas que fique bem claro, eu disse no texto que, havendo necessidade, idosos, gestantes e qualquer um que precise, deve ter um tratamento diferenciado. O que me incomoda é algumas pessoas acharem que isso é privilégio. Outro dia, dei uma bronca em minha mãe porque ela queria ir pra frente da fila, porque é idosa. Eu disse que quem ia comprar o cd era eu. Ela disse que sabia mas que, por causa disso, ela teria que ficar esperando, então ela entendia que mesmo não sendo ela a compradora, ela poderia ir pra frente e comprar o cd. Eu respondi que ela estaria certa, SE ELA FOSSE OBRIGADA A FICAR NA FILA COMIGO, o que não era o caso, pois na loja tinha um sofá. Então ela ficaria sentadinha no sofá enquanto eu pegava a fila pra pagar meu cd.
    Agora o que mais vejo em banco é gente levando os pais, colocando na fila de idoso que consulta um saldo, enquanto que o filho saca, transfere, deposita...

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