quarta-feira, 31 de maio de 2006

Entre as linhas do teleprompter

Ao ler as notícias na televisão sobre greves, se configura pra mim a existência de forças em ação que estão dando suporte a essa ou aquela atitude. Não se trata, como já pensei na minha ingênua crença esquerdista, de comunismo versus capitalismo, ou de esquerda contra direita, nem de certos contra errados, ou do bem contra o mal. Pra mim a guerra é entre "eles" e "nós". O problema é que "eles" tentam se passar por "nós" ou fazer "nós" acreditarmos que somos "eles". Ou pior, que "eles', são eles mesmos, mas estão agindo no interesse de "nós", de bonzinhos que são. Essa última, inclusive, é a idéia que mais engana "nós".


Os rodoviários entraram em greve. A justiça determinou que 70% do efetivo rodasse. O presidente do sindicato se recusou a receber a notificação do Oficial de Justiça. Ministério Público e SETPS colocaram nota na televisão dizendo que o sindicato estava notificado.

Fugir de citação é prática comum aos devedores, principalmente àqueles com maior poder aquisitivo. Sempre que há uma notícia sobre uma decisão judicial, o representante da empresa (às vezes até empresa pública) diz que só vai se pronunciar "quando for oficialmente notificado". Ou seja, a decisão já está no jornal e o cara ainda não sabe. Os deputados da CPI também não eram encontrados pra serem citados a depor, apesar de, teoricamente, estarem trabalhando na Câmara de segunda a sexta-feira. O presidente do senado se recusou a receber um oficial de justiça que o notificaria para cortar o ponto de senadores faltosos à convocação extraordinária. Ou seja, o presidente do sindicato dos trabalhadores apenas usou um expediente comum aos poderosos desse país. Se eles podem, nós também.
Outro aspecto a destacar é: que tipo de greve é esse com 70% da frota funcionando? 70% é mais do que os empresários colocam nas ruas aos domingos. A quem interessa essa decisão judicial? À população? Pois o sindicato fez uma contra-proposta: colocaria 100% da frota sem os cobradores. Atenderia muito mais à população... e aí? Justiça e Ministério Público, tão preocupados com a população, aceitam? Se não, está provado que o comprometimento desses órgãos é com o poder econômico, isso, sim.

Servidores do Judiciário fazem greve pela aprovação do plano de cargos e salários. Governo se compromete a apontar dotação orçamentária se a greve for suspensa. Servidores voltam ao trabalho e governo volta atrás. Servidores retomam greve. Jornal Nacional compara aumento de gastos de pessoal do Judiciário, Legislativo e Executivo.

Essa comparação é, no mínimo, simplista, pra não dizer que o JN foi mal intencionado em querer jogar a população contra os servidores do judiciário. Que o pessoal do executivo recebe mal, ninguém duvida, mas querer nivelar por baixo é que não dá. E pegar a estrutura do Judiciário (justiça do trabalho, justiça eleitoral e justiça federal), que está espalhada por todo o país em todas as capitais e várias cidades do interior, e comparar com o legislativo federal que se resume apenas à câmara e ao senado em Brasília, é induzir a um erro de julgamento grave. Importante notar que a estrutura do executivo também é espalhada, como o INSS, as faculdades federais, só pra dar uns exemplos. Apesar disso, os gastos desses ficaram em 3º lugar. Esse, sim, seria o grande questionamento: como uma estrutura sediada em Brasília, como é o Congresso, teve mais aumento de gastos com pessoal do que o executivo? Mas a Rede Globo não quer, no momento, briga com o executivo nem com o legislativo. Será porque o judiciário ainda é o órgão dos três poderes em que ela tem a menor ingerência?

Acho bom a população perceber logo quem são "eles" e quem somos "nós", antes de ficar aplaudindo qualquer medida que "eles" tomam na defesa de "nós".

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Que PI é essa?

Salvador sempre teve um público cativo de teatro que lota salas. Pelo menos, se estivermos falando de peças com atores globais. Não importa...